EUCARISTIA, MEMÓRIA VIVA
Este mês de junho nos traz uma grande festa em que honramos o dom da Eucaristia: a festa de Corpus Christi. Para podermos vivenciar essa festa em sua profundidade, é bom refletirmos sobre a Eucaristia como memória viva do Senhor. Em muitos lugares, esta festa vai ser vivida em meio a procissões solenes pelas ruas da cidade. Mas, para celebrá-la como convém, lembremo-nos daquela noite em que, numa ceia pascal, Jesus deu-se aos seus, como alimento vivificador: “Tomai e comei…. Tomai e bebei…”
Foi no contexto de uma ceia pascal que Jesus instituiu a Eucaristia. Não devemos refletir sobre a Eucaristia distanciando-nos deste contexto. Foi numa ceia, portanto, num momento de partilha, de comensalidade, de intimidade familiar. É em torno de uma mesa que a família se reúne, se encontra, partilha sua vida, se fortalece com o alimento que aí encontra… Foi nesse contexto que Jesus e os seus mais íntimos seguidores se reuniram para uma refeição. Mas esta refeição tinha um cunho especial: era uma ceia de celebração da Páscoa, era um ato de culto a Deus, uma expressão da fé no Deus que salva seu povo. Era uma ceia que tinha sua liturgia própria. Por isso, salmos foram rezados no final da ceia.
Mas Jesus inova esta liturgia. Os evangelistas nos relatam o que aconteceu. Vejamos como Lucas nos conta esta cena: “Quando chegou a hora, ele se pôs à mesa com seus apóstolos (………) E tomou um pão, deu graças, partiu e distribuiu-o a eles, dizendo: ‘Isto é o meu corpo, que é dado por vós; fazei isto em minha memória’. E, depois de comer, fez o mesmo com o cálice, dizendo: ‘Este cálice é a Nova Aliança em meu sangue, que é derramado em favor de vós.” (Lc 22, 14-20)
Estas poucas palavras encerram o mistério do “corpo que é dado” e do “sangue que é derramado” por “vós”. O evangelho de Mateus – assim como o de Marcos – conta esta mesma cena, mas acrescenta uma palavra que alarga seu sentido, fazendo com que o gesto de Jesus atravesse os tempos e as fronteiras geográficas para abarcar toda a humanidade. Os dois dizem: “…… sangue que é derramado por muitos” (cf. Mt 26,28; Mc 14,24).
João é o único evangelista que não menciona a instituição da Eucaristia. No entanto, ele é o único que nos transmite o relato do Lava-pés. Neste relato, Jesus faz a mesma recomendação que fez, segundo o texto da instituição de Eucaristia: “Se, portanto, eu, o Mestre e o Senhor, vos lavei os pés, vós também deveis lavar-vos os pés uns dos outros. Dei-vos o exemplo para que, como eu vos fiz, também vós o façais” (Jo 13, 14-15). Assim como devemos celebrar a Eucaristia em memória de Jesus, assim também devemos vivenciar suas atitudes de serviço e de humildade como ele o fez, em memória dele.
Quando recebemos Jesus na Eucaristia, dizemos que “comungamos”, que “recebemos a comunhão”. Quem é catequista fala em preparar crianças, ou adultos, para a “Primeira Comunhão”. Mas, o que realmente significa esta palavra? Se formos ao dicionário, vamos encontrar a seguinte definição para a palavra “comunhão”, além de “receber a Eucaristia”: “o ato ou a condição de compartilhar das mesmas ideias, valores, sentimentos”. E, para a palavra “comungar”: “pertencer a grupo que tem as mesas ideias; tomar parte em; compartilhar”… Comungar, alimentar-nos com o Corpo e o Sangue do Senhor, é um compromisso: o de nos guiarmos pelas mesmas ideias, sentimentos e compromissos que ele viveu e expressou. E isso nos levará longe…
“Esquecemos frequentemente que, para os primeiros cristãos, a Eucaristia não era só uma liturgia, mas um ato social no qual cada um colocava seus bens à disposição dos necessitados. Num conhecido texto do século II, no qual São Justino descreve como os cristãos celebravam a Eucaristia semanal, diz-se que cada um entregava o que possuía para ‘socorrer os órfãos e as viúvas, os que sofrem por enfermidade ou por outra causa, os que estão no cárcere, os forasteiros de passagem e, numa palavra, todos o que estão necessitados’[1]. Desde os primeiros tempos do cristianismo, a Eucaristia era vivida como um momento de celebração da fé e de vivência da fraternidade e da partilha.
Celebrar a Eucaristia é manter viva a memória do Senhor. É crer que ele está de fato presente em nossa vida, presente na assembleia eucarística, presente no meio de nós… É crer que ele nunca nos abandona. É reafirmar nossa opção de seguir seus passos, de moldar nossa vida pela dele. É viver sua mensagem de fraternidade e de paz.
Que este mês de junho nos renove em nosso amor à Eucaristia. A palavra “Eucaristia” significa “ação de graças”. Que possamos viver em ação de graças e tornar-nos manifestação viva do amor com que o Senhor nos amou.
Ir. Regina Maria Cavalcanti
Congregação Religiosas da Assunção
Formada em Filosofia e Teologia; Licenciatura em Letras Neolatinas